Pena de Morte: Hipócrita posição estadunidense |
Segurança Pessoal e Direitos Humanos |
Luis Beatón |
Sex, 30 de Setembro de 2011 11:55 |
Somos o único país do mundo que mata seus cidadãos enquanto dá conselhos sobre Direitos Humanos à comunidade internacional, disse Marina Correa, dias antes de que se consumasse a sentença contra seu irmão, em declarações ao jornal El País, da Espanha. Naqueles momentos, Virginia Davis, a mãe, ainda mantinha a esperança, após duas décadas de encarceramento de Troy, que se pudesse celebrar "um novo julgamento diante da falta de provas, e ele sair como homem livre". As esperanças para deter a execução se exauriam, enquanto o clamor nacional e internacional crescia e as instâncias judiciais no país faziam ouvidos surdos às demandas. O ex-presidente estadunidense Jimmy Carter, o Papa Benedicto XVI, o Prêmio Nobel da Paz Desmond Tutu e o ex-diretor do FBI e juiz William S. Sessions, instaram os magistrados a suspender a condenação e promover um novo julgamento. Tudo em vão. A Junta de Perdões do estado da Georgia aprovou a execução, apesar de que duvidosos elementos certificassem a culpabilidade. A decisão dos cinco membros do comitê desestimulou uma campanha sem precedentes no nível internacional, que solicitou a comutação da sentença por uma condenação a prisão perpétua. Sete das nove testemunhas que declararam contra o réu tinham se retratado ou se contradito em seu depoimento, e existiam dúvidas sobre a evidência física e a falta de vínculos diretos que relacionassem Davis com o crime do policial branco Mark MacPhail, em 19 de agosto de 1989, em Savannah, Georgia. As inconsistências do processo e a possibilidade de que se privasse da vida um inocente, de raça negra além do mais, encheram nesses últimos dias as páginas dos jornais e ocuparam importantes espaços na televisão. Grupos como a Anistia Internacional e a Associação Nacional para o Avanço da Gente de Cor pediram a suspensão da execução, o que foi respaldado por um pedido de mais de 650 mil pessoas a seu favor no mundo. Brian Kammer, um dos advogados de Davis, manifestou seu pesar pela decisão que encaminhava seu defendido à sala de execução, talvez consciente dos vícios judiciais, que enchem o sistema judicial estadunidense. O jornal El País recolhia o sentir de muitos quando escreveu: "Lutar por (Davis) não era só se colocar contra a pena capital, mas contra os julgamentos injustos, as irregularidades que podem ser produzidas por um sistema legal carregado de matizes, segundo o estados, relativos à cor da pele, à origem, ao dinheiro ou aos advogados disponíveis". Necessitavam de um culpado e Troy era a peça mais débil: a gente em Savannah (segunda cidade do estado) teme os poderosos, a polícia sempre é mais crível que "esses garotos negros", expressou a irmã. Neste caso saíram a reluzir as lacunas do sistema: não existiram evidências, não havia armas, testemunhas se contradisseram e, sobretudo, primou a percepção de que tratavam de buscar um culpado. A vítima esperou no corredor da morte em 1991, em 2007, em 2008, até que voltou a percorrer pela última vez um caminho que não lhe era estranho. Conhecia o protocolo, os passos, os ruídos, os gestos dos guardas... Era um especialista, segundo divulga o jornal espanhol. Não quis comer nem ser tranquilizado, já o estava. "Sou inocente", foram suas últimas palavras, antes de ser executado na prisão de Jackson, em 21 de setembro, às 23h05, depois de quatro horas de espera dentro e esperança fora. Morrer sendo considerado culpado era sua maior dor. E o dos seus, concluiu El País. Não serviu de nada saber que um ex-diretor do FBI e juiz, William Sessions, defensor da pena capital, expressasse a necessidade de propor que, quiçá, no caso de Davis, a sociedade estava se equivocando. O ex-presidente Jimmy Carter pôs o dedo na ferida quando afirmou que "se um de nossos cidadãos é executado com tantas dúvidas em torno de sua culpabilidade, então o sistema de pena de morte em nosso país é injusto e obsoleto". Carter expressou também sua confiança em que esta tragédia "nos empurre como nação para uma rejeição total da pena capital". Agora há um clamor generalizado. Com a execução, depois que o Tribunal Supremo dos Estados Unidos decidiu lhe fechar todas as portas legais, não só morreu um homem possivelmente inocente do crime que o acusavam. Também se iniciou um descenso na credibilidade de um método que ainda tem o apoio de 64% dos estadunidenses. Mas, lamentavelmente, ainda há muita gente disposta a manter este castigo, apesar de que sua aplicação está muitas vezes cheia de dúvidas e em certas ocasiões não se sabe se a vítima é inocente. Ao que parece, isso perdurará, se se leva em conta as posições dos republicanos que aspiram suceder o presidente Barack Obama na Casa Branca. Em um recente debate republicano, celebrado em princípios de setembro, na Califórnia, para constatar sua vigência, os assistentes aplaudiram as 234 condenações a morte que asinadas pelo governador de Texas Rick Perry, hoje o principal favorito para a disputa pela Casa Branca. "Aprovo a pena de morte sem que me trema o pulso e sem que me tire o sonho, porque estou cumprindo a lei", disse Perry. Desde que foi consumada a sentença contra Davis, a pena capital está em tela de juízo. Para muitos estadunidenses, o castigo deve ser revisado, ainda mais quando se dão casos em que não existem provas determinantes contra os acusados e de que a grande maioria das testemunhas depois se retratam de suas declarações. A consumação da sentença inspira hoje mais a suas detratores, que esperam, ao menos, que se façam patentes as falhas do sistema. Davis, depois de proclamar sua inocência aos familiares do policial morto em 1989, pediu a seus familiares: "Continuem investigando, escavando, trabalhando até que se prove a minha inocência". Enquanto isso, no corredor da morte esperam seu turno 3. 251 reclusos, segundo dados de janeiro de 2011. Na Califórnia há 721, seguida da Flórida com 398 e do Texas com 321. Lamentavelmente, Davis não pôde ser o preso 131 a quem foi comutava a pena depois de obter provas de sua inocência ou evidências que proporcionavam uma dúvida razoável. Na atualidade, 34 dos 50 estados do país contam com a pena de morte e os Estados Unidos continuam exigindo que o mundo respeite os direitos humanos. Luis Beatón é jornalista da Redação América do Norte de Prensa Latina | A recente execução de Troy Davis no cárcere de Jackson, Georgia (sudeste dos Estados Unidos), abriu interpretações variadas sobre este castigo que não poucos no mundo qualificam de desumano, injusto e imoral, aplicado de forma desigual a autores do mesmo crime de diferentes raças.
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