quinta-feira, 3 de março de 2011

Eduardo Campos e Gilberto Kassab: a nova direita se vestindo


Por Edilson Silva


Há poucos meses elaboramos uma “carta aberta às forças de esquerda” em que alertávamos sobre os rumos políticos do emergente governador Eduardo Campos, obcecado pela liderança de um projeto nacional encabeçado pessoalmente por ele na fase pós-Lula. Avaliávamos que este vinha surfando oportunistamente num salutar sentimento progressivo e de esquerda da população, um sentimento que não tolera mais discursos liberais ortodoxos, como o das privatizações.
Diferentemente das figuras e símbolos amarrotados da velha direita, Eduardo Campos não se confunde com o adesismo rebaixado e fisiológico de Sarney, Jucá e outros. Muito menos se coloca no espectro da oposição mais moderada, como o faz Aécio Neves (PSDB-MG). O governador atua dos dois lados do balcão, com impressionante habilidade. Contudo, como ensinava Bezerra da Silva, “malandro de mais vira bicho”. Mas este detalhe é assunto para outro texto.
Eduardo Campos utiliza-se, por um lado, do rótulo de centro-esquerda, parasitando o confuso condomínio ideológico que se criou em torno da figura de Lula. Por outro lado, malandra e contraditoriamente, apresenta-se como inovador numa prática de gestão que é uma cópia nada disfarçada do que o PSDB já vem fazendo onde governa com mais sucesso eleitoral: São Paulo e Minas Gerais.
O modelo de gestão de Eduardo Campos significa fundações privadas na gestão da saúde, desmontando o SUS; apartheid na educação, tendo em uma ponta uma escola para a ampla maioria, absolutamente sucateada, com professores precarizados e programas de aceleração da diplomação a qualquer custo, e na outra ponta uma escola distinta, de referência, em número reduzido, mas com regime integral ou semi-integral, professores melhor remunerados, etc; lógica produtivista na segurança pública, via premiação, com foco no marketing da gestão; desmonte das já precárias estruturas de controle social sobre o Estado, substituídas por câmaras de gestão burocráticas de formato empresarial, com base em resultados quantitativos. Isto é, do ponto de vista político, o modelo de gestão de Eduardo e do PSDB. Gestões conservadoras, elitistas, concentradoras de poder e anti-republicanas.
No entanto, o PSDB, ao encaminhar estas medidas em seus governos, é taxado de neoliberal, e recebe das esquerdas de ocasião, que tem força junto aos movimentos sociais, uma feroz resistência. Mas Eduardo, não. Ele, pelo verniz de esquerda da coalizão que representa, cria estruturas que são verdadeiras obras de ficção em seu governo, uma secretaria executiva qualquer aqui, uma comissão permanente de negociação acolá, e assim acomoda lideranças ligadas ao sindicato dos professores, da saúde, do movimento LGBT, do movimento negro, de mulheres, de direitos humanos, do movimento agrário, etc, faz um discursinho bonito combatendo o “passado” e um pacto de convivência em que a única coisa que efetivamente muda é o número de cargos de confiança no governo.
Mas não se constitui uma liderança nacional efetiva somente com um programa/paradigma de gestão do estado e um discurso convincente para os grandes financiadores e para o povão. É preciso ter máquina partidária, votos, estratégia por toda a geografia política do país. Assim, sempre com o objetivo primeiro de ocupar o vácuo do Lulismo e disputar pra valer o Planalto Central, sobretudo após o impressionante e imprevisível desgaste de lideranças naturais e históricas do PT, que precipitaram a candidatura inusitada de Dilma Roussef, Eduardo e seu PSB dedicaram-se a uma verdadeira cruzada no campo da luta partidária.
Vejamos sua reeleição em 2010. Ele não queria somente ser reeleito. Ele precisava ser o mais votado do Brasil. Sua mãe tinha que ser a mais votada de Pernambuco e uma das mais votadas do país, cacifando-se como opção para eventuais disputas futuras, como a que se configurou na Câmara pela liderança da bancada. Ele precisava esmagar tudo à sua esquerda e à sua direita. Esmagou muita coisa, mas não tudo, e um de seus principais desafetos dentro da aliança que o elegeu está bastante vivo, “lépido e fagueiro”. Mas este detalhe é assunto para outro texto.
Ainda em seu ambiente doméstico, onde ele foi o definidor das candidaturas majoritárias que o apoiaram, colocou Joaquim Francisco (ex-PFL, hoje PSB) como suplente de Humberto Costa. Colocou o PDT e um ex-presidente da FETAPE nas suplências de Armando Monteiro Neto. Buscou, assim, colocar travas em quem poderia, no futuro, lhe fazer sombra.
Ainda no ambiente das eleições passadas, o presidente nacional do PSB criou condições de ao mesmo tempo barganhar nacionalmente com o PT e localizar-se bem nos principais colégios eleitorais. O namoro com o PSDB de Aécio Neves em Minas Gerais foi público e constrangedor. Conseguiu a migração de um dos principais quadros de seu partido, o cearense Ciro Gomes, para São Paulo. Uma espécie de torniquete em forma de pré-candidatura presidencial até os momentos finais, em que o script pensado por Eduardo quase foi rasgado pela personalidade conhecida de Ciro Gomes, que não gostou nada do pragmatismo egoísta do parceiro. Ciro Gomes está vivo, “lépido e fagueiro”, com seu irmão governando o Ceará. Mas este detalhe é assunto para outro texto.
Ainda em São Paulo, maior colégio eleitoral do país, após o mal estar com Ciro Gomes, o governador de Pernambuco lançou ninguém menos que o ex-presidente da FIESPE, Paulo Skaf, para o governo paulista. Tudo se encaixa.
Agora, o prefeito paulistano Gilberto Kassab, DEM desde criancinha, ensaia uma relação orgânica com o PSB, numa negociação direta com Eduardo Campos. A negociação é um balaio de cobras, onde até o PMDB de Michel Temer tem as suas. José Dirceu apóia o serpentário, a presidente Dilma também. Todos sabem que está se vestindo ali um condomínio de agentes que vão brigar com força pela hegemonia do poder no país. Trata-se de um condomínio de forças conservador, de direita, privatista e cuja ideologia não sai do quadrado do mais raso oportunismo.
A deputada federal Luiz Erundina (PSB-SP), ex-prefeita de São Paulo, junto com outras lideranças, parecem estar vendo o que alertávamos há muito tempo, e já ameaçam sair do PSB e fundar outra sigla. Mas este detalhe é assunto para outro texto.
Presidente do PSOL-PE e membro da oposição popular ao Governo do Estado


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