sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011


O governo Dilma e os desafios da Esquerda, dos  Movimentos Sociais e do PSOL
As eleicões 2010 inauguraram nova fase da disputa política no país lançando gigantescos desafios para  a construção do PSOL e a luta pelo socialismo no Brasil. Enfrentaremos um governo apoiado por grande  coalizão partidária, liderada pelo PT e o PMDB, com presença em importantes ministérios de forças políticas da direita tradicional, com maioria no senado, na câmara dos deputados e nos governos estaduais. Coalizão  esta, que tem aplicado políticas econômicas e sociais que reproduzem os interesses do grande capital e a  ordem conservadora. Também no processo eleitoral de 2010 ampliou-se a audiência de uma direita cada vez mais truculenta, que se alimenta de preconceitos e falsos moralismos, capitaneada pelo PSDB e o DEM com  força em governos estaduais importantes que reúnem mais da metade do eleitorado nacional. Sendo assim, a  direita enquanto força política programática e ideológica está a um só tempo no governo e na oposição,  movimentando-se por conveniência. No essencial se unifica e constitui um campo polêtico de não-mudança  mostrando no atacado alto grau de concordâncias e divergindo no varejo.  As eleiçoes foram disputadas num cenário de consolidação da hegemonia política burguesa em nosso  país, para a qual o governo Lula, o PT e importantes organizações populares concorreram ativamente ao  legitimarem  políticas  econômicas  burguesas,  discursos  políticos  e  práticas  conservadoras,  e  as  ações  coercitivas do estado de caráter antipopular. Por outro lado, as eleições também ocorreram num cenário de muitas dificuldades para os movimentos sociais e a esquerda, sem que o Conclat tivesse, naquele momento,  alcançando a necessária unidade do movimento sindical e popular combativo; além da fragmentação da Frente  de Esquerda (com as candidaturas de Zé Maria, PSTU e Ivan Pinheiro, PCB). Outro fator desfavorável foi a  existência da candidatura de Marina Silva (PV) que, apesar do conteúdo fortemente conservador do seu  programa, conseguiu ocupar um espaço simbolicamente progressista, que em 2006 havia sido ocupado pelo  PSOL quando Heloísa Helena ficou em terceiro lugar na disputa presidencial.  Diante  deste  quadro  de  dificuldades,  a  campanha  presidencial  do  partido,  encabeçada  pelos  companheiros Plinio Sampaio e Hamilton Assis foi um contraponto de esquerda e socialista às candidaturas  do bloco dominante representada por Dilma (PT), Serra (PSDB) e Marina (PV). Plinio granjeou quase um  milhão de votos e a legenda do PSOL para deputados federais um pouco mais, em um cenário em que o  debate político de esquerda e socialista teve pouco espaço pela polarização conservadora entre os partidos da  ordem (PT, PSDB e PV). O PSOL apresentou-se com um programa de esquerda de perspectiva socialista e  conseguiu  fortalecer-se  como  pólo  de  resistência  à  onda  conservadora  da  politica  neoliberal.  Nos  congratulamos,  assim,  com  o  companheiro  Plinio  de  Arruda  Sampaio  pelo  papel  que  cumpriu,  para  efetivamente melhor definir o perfil do PSOL diante dos trabalhadores e da sociedade brasileira, apesar das  grandes dificuldades políticas e materiais. Destacamos também a participação do companheiro Hamilton  Assis, que cumpriu muito positivamente esta tarefa, seja levando as posições do PSOL no debate politico  mais geral, seja na reafirmação do papel histórico e da atualidade da resistência, indigena, negra, feminista e  popular.  Porém,  este  resultado  positivo  não  significa  que  o  PSOL  esteja  consolidado  como  alternativa  partidária. Ainda enfrentamos muitos obstáculos, a exemplo da baixa capilaridade social do partido, assim  como  a  fragilidade  de  suas  instâncias,  mas  avançamos  na  afirmação  de  um  perfil  mais  partidário  e  melhoramos nossa imagem social, para o que a candidatura de Plinio/Hamilton foi fundamental. Nisto e na  ampliação de nossa bancada parlamentar, consiste nossa principal vitória neste processo eleitoral. O PSOL  foi assim a alternativa eleitoral de esquerda para um setor de vanguarda, enquanto que os partidos que se  negaram  a  conformar  a  Frente  de  Esquerda  tiveram  um  resultado  marginal,  denunciando  assim  seus  equivocos estratégicos no terreno eleitoral.

    O PSOL conseguiu expandir sua expressão institucional com a eleição de dois senadores, três  deputados federais e quatro deputados estaduais. Por outro lado, apesar de não eleitos, devemos destacar os  resultados  eleitorais,  a  cargos  majoritários  e  proporcionais,  seja  daqueles  que  tiveram  uma  votação  relativamente melhor, seja também o papel de todas e todos que, mesmo com votações mais baixas, foram  candidatos majoritários ou proporcionais e contribuiram em situações bem dificeis para levar as propostas do  partido  e  construir  a  oposição  programática  de  esquerda.  A  vitalidade  do  partido  em  um  momento  conjuntural extremamente adverso à nossa tática eleitoral, mostra que há um espaço a ser ocupado no  espectro politico brasileiro por uma alternativa de esquerda e socialista. No entanto, consideramos uma perda  ao projeto de esquerda e socialista a não eleição de Heloisa Helena (AL) e não reeleição de Luciana Genro  (RS) e Raul Marcelo (SP), assim como a não eleição de outros companheiros com bom potencial eleitoral, a  exemplo de Renato Roseno e João Alfredo (CE), Hilton Coelho (BA), Martiniano (GO) e Robaina (RS),  dentre outros.  O cenário pós-eleitoral é de enorme complexidade e muitas dificuldades exigindo de nosso partido a  maior unidade possivel para que possamos continuar resistindo e avançando enquanto força politica de  esquerda em nivel nacional. No que pese a atual correlação de forças, que pende favoravelmente ao governo  e à oposição de direita, acreditamos que há um importante espaço para a construção de uma alternativa de  esquerda neste próximo período. Existe sempre, como foi verificado até aqui na conjuntura, a possibilidade  de  o  governo  manter  o  arrefecimento  da insatisfação  e  consequentemente  das  mobilizações  populares,  através de medidas compensatórias ou pequenas concessões econômicas, contudo, um dos fatores que poderá  provocar desgaste ao novo governo é a perspectiva de desaceleração da economia em função da continuidade  da crise econômica internacional, agora transvertida de guerra cambial. O que, por sua vez, exigirá novos  apertos fiscais, já anunciados pela equipe de transição: aumento da taxa de juros e do superávit primário;  cortes dos gastos sociais (saúde, educação, reforma agrária, etc.); restrição de direitos previdenciários e  subordinação da previdência pública à lógica de mercado através de medidas como a desoneração da folha  de pagamentos das empresas (acabando com o salário educação e reduzindo o desconto de INSS de 20%  para 14%); arrocho salarial do funcionalismo federal; restrição ao crédito entre outras medidas.  

A maioria que o governo obteve no senado e no congresso servirá de base para a aprovação destas  medidas, ao mesmo tempo em que entrará em conflito com agendas progressivas vinculadas aos movimentos  sociais  e  já  defendidas  pelo  nosso  partido.  Já  neste  início  de  governo  Dilma  dois  fatos  importantes  confirmam esta tendência: o pedido de demissão do então presidente do IBAMA frente às pressões para que  fossem aceleradas as obras da hidroelétrica de Belo Monte; e as medidas anunciadas pela nova Ministra da  Cultura,  apontando  para  um  retrocesso  na  discussão  sobre  os  direitos  autorais  no  Brasil,  sob  o  forte  questionamento  do  movimento  de  cultura  livre.  Nesta  perspectiva  a  oposição  de  direita  continuará  enfrentando o mesmo dilema: ser oposição sem conseguir, ou poder, diferenciar-se no essencial da política  do governo. De nossa parte, devemos reafirmar e dar ampla ação social e institucional à nossa política de  oposição de esquerda e programática ao novo governo federal e aos governos estaduais.  Pela sua composição política, o governo Dilma, assim como o de Lula, não é e nem será um governo  em “disputa”, dividido entre setores “desenvolvimentistas/progressistas” e “monetaristas/ortodoxos”. Apesar  das contradições e divergências que possam existir, como é natural em qualquer governo, a orientação geral  predominante, e que se reflete na indicação de Antônio Palocci para a chefia da Casa Civil, está baseada na  defesa da mesma política liberal e conservadora que rege a economia desde a época de FHC, baseada no  cambio flutuante; disciplina orçamentária para cumprir as metas de superávit primário (transferindo bilhões  para o pagamento da famigerada dívida pública) e as metas de inflação (fonte dos maiores juros do planeta e  que continuam engordando o bolso dos banqueiros). Fatores estes que inibem qualquer política econômica  progressista destinada a atender as demandas populares e fortalecer a soberania do país.  Por outro lado, a dupla crise social vivida no Rio de Janeiro (catástrofe na serra e ação militar nas  favelas) desnuda, mais uma vez, as condições socioambientais de barbárie vividas nos principais centros urbanos do país. Neste sentido, o que temos presenciado no Rio de Janeiro é uma demonstração cabal de  incapacidade do capitalismo brasileiro em garantir condições dignas de vida a estas grandes massas urbanas,  devido a sua dinâmica baseada na concentração de renda e na reprodução da desigualdade social e o uso dos  espaços urbanos e rurais segundo os critérios da especulação imobiliária e da reprodução do capital. As  quase mil mortes e os mais de 20 mil desabrigados não podem ser atribuídos somente aos efeitos da  “catástrofe  natural”,  pois  as  mesmas  também  estão  diretamente  relacionadas  à  falta  de  iniciativa  governamental para evitar estas tragédias, tendo em vista que o sucateamento da Defesa Civil e a falta de  investimentos nos setores estratégicos para o combate às enchentes também é responsabilidade direta dos  governantes. O relatório preliminar de inspeção realizado pelo CREA-RJ na região serrana do Rio aponta  que  80%  das  mortes  teriam  sido  evitadas  caso  a  legislação  ambiental  do  País  fosse  respeitada  pelas  prefeituras das cidades afetadas.  Por este motivo, além da solidariedade efetiva através da doação de donativos aos desabrigados, o  PSOL  defende  abertura  de  investigação  nas  esferas  dos  poderes,  para  apurar  responsabilidades  dos  governantes, vez que já era de domínio público a possibilidade de chuvas fortes no verão, bem como vários  alertas oriundos de especialistas. Defendemos ainda um plano de obras públicas emergencial, com a criação  de um fundo nacional para a reconstrução da Região Serrana, capaz de gerar milhares de empregos nas  atividades de construção de moradias, estradas e postos de saúde nas áreas atingidas; a indenização de todas  as famílias; e uma nova política de prevenção de desastres naturais, aproveitando a tecnologia desenvolvida  nas universidades, a partir do incremento do orçamento público destinado para estas áreas.   A tragédia do Rio deu ainda maior centralidade para a questão ambiental no país, abrindo inclusive  espaço para que seja derrotada a nefasta reforma do Código Florestal - com a possibilidade de atuarmos em  unidade de ação com diversos setores políticos e sociais que vão tomando cada vez mais consciência do que  significa esta reforma proposta pelo governo através do deputado Aldo Rabelo (PCdoB). Precisamos abrir  um amplo debate na sociedade brasileira sobre a urgência de uma política ambiental para o Brasil, que além  da preservação da Amazônia através de uma política de desmatamento zero, seja capaz de apresentar uma  solução para as grandes cidades, onde se reproduzem as regiões de risco fruto de uma ocupação urbana  desordenada e a falta de uma reforma urbana e agrária que enfrente este problema pela raiz.

Neste  quadro  de  dor  e  sofrimento  provocado  pelas  tragédias  sócio-ambientais,  a  atitude  dos  parlamentares (deputados federais e senadores) de votaram um grande aumento de seus próprios salários,  enquanto o governo oferece migalhas aos desabrigados e uma proposta de reajuste irrisório para o salário  mínimo, provocou revolta e perplexidade na grande maioria da população. O aumento de 62% para os  deputados, 134% para Dilma e de 149% para os ministros é um escândalo. O PSOL foi o único partido a  votar contra este abuso de poder dos parlamentares e o único a exigir o cumprimento das promessas de  campanha do governo Lula em relação a valorização do salário mínimo. Lula prometeu dobrar o salário  mínimo em seus oito anos de seu governo, o que hoje representaria um salário mínimo de R$700,00. Este,  portanto,  será  o  valor  que  o  PSOL  defenderá  para  o  reajuste  deste  ano.  Desde  já  o  PSOL  reforça  a  convocatória dos movimentos sociais e sindicais para a realização de uma manifestação nacional em Brasília,  no dia 16 de fevereiro, para pressionarmos por um maior reajuste do salário mínimo.  O PSOL enfrentará esta nova conjuntura com um acúmulo importante de experiência na luta social e  parlamentar, tendo consolidado bandeiras que hoje são as marcas de nosso partido junto a importantes  setores da população, a exemplo da luta contra a corrupção, a luta pela aprovação da Lei da Ficha Limpa (em  que pese as contradições dessa lei, pois a mesma  vem sendo utilizada também na criminalização dos  movimentos e lutadores sociais, como ocorreu nas últimas eleições com a condenação a priori e injusta dos  candidatos a vice-governador em São Paulo e o pré-candidato a governador de Minas); a luta pela reforma  agrária;a CPI da dívida pública e a luta por sua auditoria, articulada com a defesa de recursos para as  políticas públicas sociais; a defesa do código florestal contra a reforma orquestrada pelos latifundiários; a  luta contra a Reforma da Previdência e outras reformas trabalhistas que vem sendo articuladas pelo novo governo e a defesa dos aposentados pelo fim do fator previdenciário; a luta contra grandes projetos que  representam um crime socioambiental, como Belo Monte e a Transposição do São Francisco; a luta pela  jornada  de  40  horas  semanais  de  trabalho,  sem  redução  do  salário,  que  foi  importante  eixo  de  nossa  campanha presidencial; a luta pela reforma política, especialmente quanto ao financiamento público de  campanha e a ampliação da democracia participativa, com a realização de plebiscitos e referendos sobre  temas de interesse nacional; a luta por uma reforma tributária progressiva e a taxação das grandes fortunas;  entre outras lutas que nos referenciaram enquanto um partido sério e dos mais atuantes. Fato reconhecido  pela imprensa e jornalistas, que no prêmio Congresso em Foco elegeram os três deputados federais do PSOL  entre os cinco melhores do Congresso Nacional.   A esta pauta devemos incorporar com força a luta em defesa dos direitos humanos, incluindo a  defesa permanente do mandato de Marcelo Freixo (PSOL-RJ), ameaçado de morte pelas milícias e hoje uma  das principais lideranças dos direitos humanos no país, tendo ganho grande projeção após o filme Tropa de  Elite II em que sua luta é retratada por um dos principais personagens do filme, o deputado Fraga. O apoio à  luta  de importantes  segmentos  que  clamam  pela  democratização  dos  meios de  comunicação no  Brasil  também será uma importante tarefa do PSOL, que entrou junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) com uma  Ação  Direta  de  Inconstitucionalidade  por  Omissão  (ADO  n.  10)  ajuizada  pelo  jurista  Fábio  Konder  Comparato,  que  requer  à  Corte  que  determine  ao  Congresso  Nacional  a  regulamentação  de  matérias  existentes em três artigos da Constituição Federal (220, 221 e 223), relativos à comunicação social. Entre as  providências,  está  a  criação  de  uma  legislação  específica  sobre  o  direito  de  resposta,  a  proibição  de  monopólio ou oligopólio dos meios de comunicação social e a produção e programação exibida pelos  veículos.  Este acúmulo e este perfil que consolidamos até aqui, e que constituiu hoje a base fundamental para  futuros avanços do PSOL, deve ser acrescido de uma dinâmica partidária que seja capaz de unificar e  fortalecer a atuação do partido diante das questões fundamentais da luta de classe e da luta social e cultural  em geral, no próximo período. Para isso, precisamos promover um rico debate no interior do partido visando  politizar cada vez mais nossa intervenção na luta social e institucional, tornando o III Congresso do PSOL,  que será realizado em setembro de 2011, um momento de acúmulo programático e fortalecimento orgânico  de nossa militância partidária. Junto ao processo de organização do III Congresso, devemos promover campanha política de massas baseada em alguns eixos prioritários. Esta deverá ser articulada com uma  campanha nacional de filiação no partido, buscando acolher os novos militantes que simpatizaram conosco  no processo eleitoral, assim como melhorar nosso padrão organizativo. Esta campanha será coordenada pela  executiva nacional, com materiais unificados para todo o país, incluindo um plano de formação que inclua  materiais e eventos partidários unificados.

Executiva Nacional do PSOL 
Brasilia/DF, 27 de janeiro de 2011

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